Foi lançado esta terça-feira (31 de Março), em Maputo, um estudo denominado “Refugiados Climáticos: Impactos das Mudanças Climáticas nas zonas costeiras de Moçambique”, no âmbito de um projecto com o mesmo nome, que está sendo implementado pela Livaningo, em parceria com a Counterpart International (CPI).
A pesquisa visava apresentar evidências sobre existência de refugiados
climáticos como consequência das mudanças climáticas; entender o efeito dos
eventos extremos tais como ciclones, cheias seca, etc, sobre a população e; fazer
uma análise situacional de uma inclusão nos principais documentos de referência
a nível nacional por forma a trazer recomendações claras sobre a inclusão,
reconhecimento e protecção dos migrantes climáticos em Moçambique.
O trabalho foi desenvolvido nas províncias costeiras de Cabo Delgado (na
Cidade municipal de Pemba), Nampula (Município da Ilha de Moçambique e Nacala),
Zambézia (Quelimane) e Inhambane (Cidade de Inhambane e Município de
Vilankulo). Os municípios foram propostos pela Livaningo em coordenação com a
CPI. O objectivo da pesquisa era trabalhar com as autarquias costeiras tendo em
conta que a CPI tem estado a financiar estudos nas zonas costeiras.
O estudo constatou que as mudanças climáticas são uma realidade em
Moçambique. Os últimos eventos climáticos, nomeadamente ciclone Eline, Flavio,
Idai e Kenneth trouxeram inúmeros impactos socioeconómicos às populações
urbanas e rurais. Como evidência, o ciclone IDAI afectou 1.85 milhões de
pessoas, tendo deslocado 146 mil pessoas e destruído 239 mil casas. Outrossim,
destruiu cerca de 1 milhão de hectares e infraestruturas avaliadas em 1 bilhão
de dólares norte americanos. O ciclone Kenneth afectou 250 mil pessoas, tendo
deslocado 24.036 pessoas e 44,9 mil casas destruídas. A ocorrência desses
eventos em Moçambique suscita intervenções urgentes em relação migrações
humanas em larga-escala devido a escassez de recurso e meios de subsistência e
aumento de eventos extremo e intensificação da competição enter e
intra-comunitária para aquisição de alimentos, água e outros recursos ou meios
de subsistência particularmente nas zonas afectadas.
Os pesquisadores recomendam ao governo para levar à cabo acções que permitam
a melhor protecção do migrante ambiental tais como: infraestruturas preparadas
para receber os possíveis migrantes, garantir a alimentação e acomodação dos
refugiados ambientais; inclusão de todos os segmentos da sociedade na
elaboração dos instrumentos normativos e na sua implementação e; criação de uma
equipa multidisciplinar de trabalho que esteja altamante treinada para lidar com
pessoas afectadas pelas mudanças climáticas.
“A pesquisa documental constituiu a principal técnica de recolha de dados
na realização deste trabalho. Consistiu na recolha, análise e interpretação de
relatórios, orçamentos e demais documentos, na sua maioria legislação publicada
pelo governo moçambicano sobre questões ambientais. A pesquisa documental
permitiu constatar que relativamente a legislação e demais instrumentos legais,
o país avançou bastante na institucionalização de medidas tendentes à
preservação do ambiente. Para a obtenção de dados, realizamos em todas as
cidades municipais visitas aos locais previamente estabelecidos pela Livaningo,
entrevistas semiestruturadas aos
responsáveis locais do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC),
Conselho Municipal das Cidades e Direcção Provincial de Terra, Ambiente e
Desenvolvimento Rural e população afectada pelos eventos climáticos. Em alguns
locais (Pemba, Nacala e Quelimane) também realizamos entrevistas com os
secretários dos bairros afectados pelos eventos climáticos e as respectivas
famílias afectadas. Em Nacala Porto também interagimos com população reassentada”,
explicou um dos pesquisadores.
Nos últimos 20 anos, mais de 8 milhões de moçambicanos foram afectados por
desastres naturais causados por fenómenos naturais, retrocedendo
significativamente o desenvolvimento económico do país (INGC, 2017). Em
Fevereiro do ano 2000 o país foi assolado por cheias de grandes proporções
afectando 4,5 milhões de pessoas em três meses de inundação e dizimando outras
800. No mesmo mês o ciclone Eline devastou a costa moçambicana causando
destruição com ventos até 260 Km/h (Patt and Schoter, 2008). Nos anos de 2001,
2007 e 2008 chuvas torrenciais causaram cheias ao longo da bacia do Rio Zambeze
no centro de Moçambique. As cheias de 2007 foram seguidas do ciclone Flávio
aumentando o número de desalojados em cerca de 100.000 pessoas (Stal, 2011). As
maiores secas ocorreram nos anos de 1980, 1983, 1985 e 1992, e em consequência
disso mais de 100.000 pessoas morreram e 17 milhões foram afectadas (Word Bank,
2011). Entre os anos de 2015 e 2017 Moçambique foi afectado pela seca que obrigou
o país a procurar assistência humanitária. Durante o mesmo período, as
estatísticas revelam que mais de 2.2 milhões de moçambicanos foram afectados
pela seca (Mate, 2017; 2016).
As cidades costeiras moçambicanas são caracterizadas por um elevado número
de população que maioritariamente se dedica à actividades económicas como a
pesca e agricultura. Estas populações são também ciclicamente afectadas por
eventos climáticos e, por isso, ficam sujeitas às mudanças das áreas
consideradas vulneráveis para as consideradas seguras ou menos vulneráveis. Com
este estudo pretendia-se captar a sensibilidade da população em relação à
necessidade de mudança, isto é, pautar por fixar residências em áreas seguras.
Os pesquisadores referem que refugiados ambientais incluem pessoas que não
têm controlo sobre sua relocalização. Os emigrantes ambientais são obrigados a
se deslocarem, mas têm maior controlo sobre a decisão de migrar. Finalmente, os
migrantes voluntários detêm controlo sobre todo processo de migração.
“Esta clarificação dos conceitos é particularmente importante porque se
configura num primeiro exercício com vista a inclusão dos desafios migratórios
na definição das políticas e estratégias ambientais do país. Dados os efeitos
acentuados dos eventos climáticos sobre os fluxos migratórios do país, urge uma
política estratégica sobre como lidar com a problemática das migrações
ambientais. Tendo em conta a discussão acima feita, julgamos que o termo
migrante ambiental é o mais apropriado à situação de Moçambique. A utilização
da expressão ‘migrante ambiental’ (ou deslocado ambiental) tem o potencial de
atingir a todas as pessoas incluindo-se os próprios “refugiados climáticos”
(Blank, 2015).”
O estudo aponta que há muitas razões que ditam os deslocamentos internos,
desde as políticas até às que têm a ver com os desastres naturais. No que tange
aos desastres naturais os dados mostram que nos últimos 10 anos o número de
deslocados internos sempre variou tendo atingindo o seu pico em 2017 com
186.000 pessoas deslocadas internamente. Os motivos desses deslocamentos
internos variam desde a seca, os ciclones e as inundações.
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