Desafios no processo
da canalização da taxa de 50% resultante
de denúncias de exploração de recursos florestais e faunisticos
Sumário
Dados do
Ministério da Terra e Ambiente apontam que em Moçambique, as florestas ocupam
cerca de 32 milhões de hectares correspondentes a cerca de 40% da área total do país, dos quais
17,2 milhões de hectares com potencial para a produção de madeira.
O sector florestal conta com 1003 operadores florestais dos quais 225 (22%) são operadores em regime de concessão e 778 (78%) de operadores em regime de licença simples. O sector emprega cerca de 14 mil trabalhadores.
O país
ainda enfrenta desafios para a sua conservação, estimando-se que os níveis de
desmatamento ao nível nacional sejam de 219.000 hectares por ano, onde entre
outras causas, destacam-se a agricultura itinerante, expansão urbana,
exploração ilegal, mineração e a produção de combustíveis lenhosos.
A
exploração ilegal de madeira tem lesado o Estado moçambicano em cerca de 200
milhões de dólares por ano, um valor significativo para impulsionar o
desenvolvimento sócio- económico do país, com particular destaque para as zonas
rurais.
Segundo a
DINAF, os resultados da modelagem futura da cobertura florestal estimam uma
cobertura florestal nacional na ordem de 28,836,360 de hectares, prevendo uma
perda de floresta total de 2,8 milhões de hectares para o período de 2017 a
2035, considerando um cenário em que as tendências de desflorestação se mantém
(business -as-usual).
A
província de Sofala é rica em recursos florestais, explorados há vários anos
por operadores nacionais e estrangeiros. Os recursos florestais de Moçambique
constituem um bem de dominio público e propriedade do Estado. Assim, o Maneio
Comunitário dos recursos florestais é baseado no conceito de gestão colectiva
da floresta, como um bem comum partilhado, onde um grupo de pessoas
compartilham as normas de acesso e uso dentro de um território definido e
formalmente delimitado, que administram em nome ou de forma conjunta com o seu
proprietário, neste caso o Estado.
Com efeito, de acordo com o número 4
do artigo 39 da Lei 10 de 1999 de 7 de Julho, a lei determina que os
intervenientes no processo de fiscalização de controle dos recursos florestais
e faunísticos, devem beneficiar de uma percentagem do valor das multas (50%),
resultantes da transgressão da legislação que regula uma exploração racional e
sustentável desses recursos. Ou seja, o regulamento determina que “50% dos
valores provenientes das multas por transgressão à legislação florestal e
faunística, destina-se aos fiscais de florestas, fauna bravia e aos agentes
comunitários, que tiverem participado no levantamento do processo de
transgressão respectivo, bem como as comunidades locais ou a qualquer cidadão
que tiver denunciado a infracção.
Como principal conclusão deste artigo de reflexão, o programa “Comités de Gestão dos Recursos Naturais (CGRN) de Sofala: Governação Local, Direitos e Mudanças Climáticas”, em execução desde 2017 e constituído pela Adel-Sofala, Livaningo, Muleide, IPAJ e a Rede de Jornalistas Amigos do Ambiente, defende que há necessidade de divulgar com mais vigor os direitos dos denunciantes dos exploradores ilegais de recursos florestais e faunisticos nos distritos de Cheringoma, Gorongosa e Marínguè, uma vez que a maioria das pessoas nas comunidades desconhece os seus direitos e muito menos os passos a serem seguidos após uma denúncia.
Por outra, os técnicos do Governo
devem ser mais abertos a esses assuntos, porque até ao momento, a divulgação da
legislação tem sido muito fraca nas comunidades. Os membros das comunidades
entendem que há muito dinheiro retido nos cofres do Estado e quem fica prejudicado
é a população. O maior problema é causado pela falta de informação, facto que
gera uma certa frustração no seio das comunidades e faz com que alguns acabem
se aliando aos exploradores ilegais como forma de ganhar algum dinheiro de
forma imediata.
Introdução
O presente artigo de reflexão visa
debruçar-se sobre o grau de sucesso na implementação da legislação no processo
da canalização da taxa de 50%, resultante das denúncias de exploração ilegal
dos recursos faunísticos e florestais e as lacunas da legislação que regula
esse direito aos denunciantes.
O programa “Comités de Gestão dos
Recursos Naturais (CGRN) de Sofala: Governação Local, Direitos e Mudanças
Climáticas” constatou que existem muitos desafios no processo da canalização da
taxa de 50%, resultante das denúncias de exploração ilegal dos recursos
faunísticos e florestais e as lacunas da legislação que regula esse direito aos
denunciantes, ainda que, sete jornalistas de diversos órgãos de comunicação
social da província de Sofala, vão receber dentro de dias, uma das maiores
recompensas da canalização da taxa de 50% resultante da denúncias de exploração
ilegal de recursos florestais.Trata-se de uma denúncia de contrabando de
madeira - mais de 11 metros cúbicos de madeira das espécies Chacate Preto,
Chanate e Nkula, cortadas ilegalmente e armazenadas em dois estaleiros nas
regiões de Muxúnguè no distrito de Chibabava e Sena em Caia.
A madeira apreendida já foi vendida em
hasta pública em finais de Fevereiro, num valor estimado a 39.000.000 de meticais,
estando neste momento a decorrer o processo de dedução dos valores de 50% para
o pagamento dos denunciantes.
A Agência Nacional de Controlo de
Qualidade Ambiental (AQUA) referiu que, foram actuadas mais de 40% das multas,
estimadas em 13 milhões de meticais aplicadas em 2021. Oos denunciantes já
receberam os valores e os restantes aguardam pela resolução judicial, uma vez
que os infractores recorreram da sentença.
A noticia que dá conta que sete
pessoas vão receber recompensa de cerca de 20 milhões de meticais é sem dúvidas
um marco importante na transparência da canalização da taxa de 50% aos
denunciantes, contudo, ainda existem muitos casos mal parados sobre os mecanismos
de canalização da taxa de 50%, resultante das denúncias de exploração ilegal
dos recursos faunísticos e florestais, devido a não regulamentação de
documentos ou constragimentos de vária ordem. Para piorar, segundo as
autoridades de tutela, o dinheiro no tesouro tem um tempo limite, passados
muitos anos dificilmente recupera-se o valor. Ainda existem muitas comunidades
que que nunca se beneficiaram do prémio de multas aplicadas sobre a exploração
ilegal de recursos florestais, nas respectivas zonas.
Os presidentes dos Comités de Guma,
Catemo e Nhabaua no distrito de Cheringoma por exemplo, afirmaram que são
tantos os casos de infracção nas operações florestais, nas suas comunidades,
que já nem se lembram de quantos foram no total, desde que se encontram
envolvidos neste trabalho, ou seja, desde 2007. Referiram ainda que, na sua maioria, os
casos envolvem membros da comunidade local que se dedicam à produção de carvão,
os quais tem feito o abate indiscriminado de árvores.
Sobre o tratamento que dão aos
supostos prevaricadores, responderam que têm sido levados à sede do comité onde
são sensibilizados a não retornarem à prática. Nos casos em que se observa
relutância ou reincidência são encaminhados as autoridades estatais. Sobre as
multas, os mesmos afirmam que muitas vezes não têm recebido por razões de vária
ordem.
Comunidades e
autoridades locais de costas voltadas
Comunidades ouvidas pela Livaningo
revelaram que há pouca confiança em relação à transparência por parte das
autoridades dos distritos. “Quando apresentamos uma denúncia somos excluídos
dos passos subsequentes. Não assinamos nenhum documento. Estamos cansados, por
isso, preferimos pegar esses nossos e cobrar multa para as comunidades.”
Relativamente aos operadores florestais, os entrevistados disseram que
neutralizar camionistas tem sido muito difícil, por não possuirem meios para
imobilizar as viaturas em circulação.
“Não temos essa capacidade. A nossa
intervenção tem sido mais para os homens de corte e não são muitos casos que
temos conseguido porque as zonas de corte também ficam distantes das nossas
áreas residenciais. Mas sempre que ocorre um caso nas redondezas temos
conseguido capturar os autores e geralmente apreendemos os instrumentos de
corte. Não temos capacidade para neutralizar transportadores”.
Por sua vez, as autoridades de tutela
alegam que para que os valores de comparticipação sejam transferidos é preciso
que os denunciantes tenham NUIT, conta bancária, etc, contudo, muitas vezes os
denunciantes não possuem tais documentos. Segundo o governo, muitas vezes é
feita a transferência para as contas dos denunciantes, mas esse valor acaba
extornado porque as contas não estão em dia e quando pede se ao denunciante
para ir a cidade da Beira, apresentam dificuldades de transporte. Por outro
lado, em alguns casos não há resposta dos desfechos pois a maioria dos
processos depende do tipo crime que são encaminhados para o tribunal para que
seja julgado por um Juiz e quando é assim leva muito tempo.
Algumas comunidades como é o caso de
Canda e Nhanguo do distrito de Gorongosa e Palame, Tucuta, Macoco e Nhanchir do
distrito de Marínguè não têm domínio da Lei e do Regulamento sobre Floresta e
Fauna Bravia e, consequentemente não conhecem os passos ou procedimentos que
devem seguir para receber a compensação de 50% do valor total da multa
resultante dessa apreensão, como denunciante.
Por fim, há casos de líderes locais
que entram em esquemas com exploradores ilegais. Infelizmente, envolvem-se em esquemas
por serem aliciados com altos valores monetários.
Governo reconhece
fragilidades na canalização de taxa de 50% aos denunciantes
A Direcção Nacional de Florestas
(DINAF) reconheceu as fraquezas do governo para a disseminação da legislação
nas comunidades pela limitação de fundos e recursos humanos para abrangir todas
comunidades do país e pediu apoio as organizações da sociedade civil para
promover a divulgação da legislação nas comunidades.
A DINAF também reconheceu que existe
uma falha na comunicação e partilha de informação nas comunidades, uma vez que,
os relatórios de todos casos de apreensão são elaborados e partilhados pelos
governos distritais locais e estes por sua vez deveriam veiculá-la à
comunidade, onde foi denunciado o acto e informar os denunciantes sobre o
desfecho do caso.
A DINAF refere que as pessoas que
forem encontradas, envolvidas em esquemas de corrupção, estão sendo sancionados
segundo a legislação, mesmo sendo régulo, chefe do posto ou qualquer membros do
governo e comunidade, isso tem servido de exemplo para desmotivar esses actos.
O programa “Comités de Gestão dos
Recursos Naturais (CGRN) de Sofala: Governação Local, Direitos e Mudanças
Climáticas entende que as comunidades devem ler mais os documentos, a legislação
que é deixada depois das formações e questionar mais o Governo distrital
visando obter esclarecimentos; Que haja maior abertura, melhor comunicação
entre o Governo provincial e distrital e a comunidade.
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